Consumo constante, passivo e sem reflexão

Quantos podcasts você ouve enquanto está no trabalho? Qual é seu conteúdo favorito de ver enquanto almoça? Que noticiário te informa enquanto você malha? Como você passa o tempo enquanto lava louças?

Estas perguntas podem não se aplicar ao seu contexto de vida, mas são pertinentes dentro do cotidiano de consumo de mídia dos brasileiros desde a pandemia. Pesquisas de hábitos de consumo na internet revelam que, desde 2020, os usuários nacionais de internet passam cerca de dez horas em frente a telas de computadores, sejam eles de mesa ou de bolso, e pelos mais diversos motivos e finalidades.

O trabalho cada vez mais digitalizado e conectado, chegando a porcentagens cada vez mais consideráveis da população, contribuem para o número, é evidente. Mas o acesso a entretenimento nas redes sociais e em plataformas de conteúdo como o YouTube, por exemplo, é sedutor demais. O relatório Digital 2024: Global Overview Report, da consultoria Eletronics Hub, revelou que, em média, gastamos três horas e 37 minutos nestes ambientes por dia, nos colocando na segunda posição do ranking analisado.

Não à toa, o Brasil possui hoje um grande mercado produtor de conteúdo multimídia. Desde os assuntos nichados e complexos, até o mais popular dos temas, há sempre uma cena de youtubers consolidada e presente produzindo centenas de horas diárias de novos vídeos. Esta oferta, combinada com a demanda de pessoas cada vez mais solitárias, com suas atenções drenadas pelas telas, gera um consumo desenfreado, constante, automatizado.

Os algoritmos sugerem aquilo que veremos ao acordar, ao almoçar, indo e voltando do trabalho, e até vídeos para pegar no sono mais rápido. A libido sexual se condicionou ao acesso indiscriminado a pornografia dos mais variados tipos, que tornam a realidade do sexo monótona. Os hits musicais devem se adequar a fórmulas que prendem os usuários com refrões no início das canções, e não devem durar muito mais que dois minutos. E no cinema, mais importante do que ver o filme é acompanhar o lançamento de trailers, as notícias de bastidores e as especulações dos sites de cultura pop.

Não há tempo para reflexão. Nem há desejo, por parte de quem mantém esta estrutura industrial de conteúdo, de que estes momentos existam. Pois cada período que a audiência passa fora das plataformas, sem consumir, significa menos exibição de vídeos. A vida cotidiana, real, passa a ser uma concorrente pelo tempo de cada um.

Assim, caímos num consumo apático, passivo. Mesmo que seja crítico no seu conteúdo, ou informativo e edificante, é feito e assistido numa lógica que impede a reflexão. Pois sempre haverá outro novo vídeo, começando em dez segundos, que capturará sua atenção. Ou seu feed vertical trará um outro reel, que te dará mais uma emoção barata. E isto se repete a um ponto que o silêncio, o tédio, e o próprio ato de pensar se tornam impossíveis.

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