Em vídeo publicado nesta terça-feira (7), Mark Zuckerberg, dono da bigtech Meta, declarou que reduzirá os esforços em combate a desinformação e eliminará a política de checagem de fatos dentro de suas redes sociais. O posicionamento foi encarado com um aceno político claro do bilionário ao novo governo de Donald Trump, que se inicia ainda neste mês de janeiro.
Há algo de especial nesta publicação: ela marca o rompimento da influência de um certo ideário liberal (aqui no sentido norte-americano do termo, em contraposição política ao conservador) nos valores do maior conglomerado de redes sociais do mundo. O processo em si não é novo, posto que o antigo Twitter se transmutou em uma plataforma acolhedora a extrema-direita após se tornar X, sob a direção de Elon Musk.
Zuckerberg mencionou em mais de uma ou duas oportunidades, em menos de cinco minutos, sobre a importância de ‘voltarmos às nossas raízes em torno da liberdade de expressão no Facebook e Instagram’. Depois expôs categoricamente a forma que lidaria com isto internamente: reduzindo a fiscalização e afrouxando as regras de violação das políticas da comunidade. Também deixou claro que a concentração de funcionários californianos no trabalho de apuração dos conteúdos em análise atrapalha a confiança do país nas ações definidas.
E, por fim, declarou estar pronto para defender os interesses norte-americanos no mundo, ao lado do presidente eleito Donald Trump. Recado com endereços na Europa e América Latina: as áreas de disputa que, aos olhos americanos, lhes cabe batalhar por influência.
Trata-se de um cenário preocupante, mas não surpreendente. Esta eleição já era vista como definidora dos paradigmas dos próximos anos no mundo. Venceu o plano que dobrou a aposta na violência, em mentiras e no crescimento da extrema-direita como projeto de futuro. Estamos começando a ver os efeitos disto na prática.
Se tivesse ganhado o projeto liberal de Kamala Harris, levando os EUA para oito anos de gestão democrata (e com potencial de atingir doze primaveras), quem sabe o que estaríamos vendo? Talvez o reforço em ações para garantir um espaço saudável, livre de discursos de ódio. Uma decisão que parece muito fisiológica, portanto.
Não se deve esquecer que o desenvolvimento de tecnologias para checagem de fatos custa caro e traz pouco retorno aos negócios. São inovações burocráticas. Não tem impacto estético nas fotos e vídeos produzidos pelo usuário, por exemplo. Ou não adiciona a possibilidade de gerar um texto automático por IA. Portanto, se for possível não investir nestas áreas, melhor ainda.
Este litígio entre o Vale do Silício (ou do que restar dele após as empresas fugirem de seus funcionários liberais) e a visão de mundo liberal e progressista é um dos grandes acontecimentos desta indústria. Sempre que se conta sua história está presente uma certa aura de contracultura. São empresas conhecidas por terem sido fundadas por ex-hippies, por rasgarem o protocolo dos ternos e gravatas e pelo ambiente de trabalho cool. O que é resultado, por sua vez, de um investimento estadual em educação histórico, acima da média nacional, durante gerações. Gerou-se um caldo de cultura profundamente liberal, de estética progressista e até transgressora, que influenciou seus serviços e produtos.
Agora, no entanto, vemos a bola ir para o outro lado da quadra. O pensamento liberal-progressista norte-americano deste século falhou em produzir e pôr em prática qualquer ideia de avanço social concreto. Pelo contrário, terceirizou este setor para a iniciativa privada, que por algum tempo vestiu a máscara liberal. Agora, que os ventos não sopram da mesma forma, se curvam perante o novo rei posto e sua lei.