Os Fabelmans (2023)

“Os Fabelmans”: registrando uma época

Cantar é mais do que lembrar,

É mais do que ter tido aquilo, então

Mais do que viver, do que sonhar, 

é ter o coração daquilo

Genipapo Absoluto – Caetano Veloso

[Este texto possui spoilers]

A espécie de cinebiografia que Steven Spielberg se propôs a fazer conta uma história coletiva, não só individual. 

Os Fabelmans (2023) retrata a infância e juventude de Sammy Fabelman, um garoto norte-americano, de família judaica, num mundo pós-segunda guerra. Ele e suas duas irmãs crescem no meio de um conturbado relacionamento entre seus pais. Também são desafiados pelo sentimento antissemita, ainda presente num mundo pós-nazismo. 

Para crescer e se estabelecer num ambiente tão complexo, o protagonista encontra refúgio criativo no cinema. Não só como espectador, mas principalmente como criador de filmes. 

E é por conta da sétima arte que os principais eventos do longa são disparados, numa clara rima narrativa com a história de Spielberg – quer dizer –  de Sammy. 

A história contada na porção inicial do filme retrata uma família jovem, de classe-média, em uma década de rápido desenvolvimento econômico nos Estados Unidos. Burt Fabelman, o pai, é um profissional da jovem área de computação e informática, que tivera grande desenvolvimento na década anterior, ao longo da segunda guerra. 

Em contraponto, Mitzi Fabelman, a mãe, é uma dona de casa com grande amor pelas artes, tendo a música em destaque. Se mostra frustrada por não ter seguido uma carreira na arte – um sentimento que se demonstra latente ao longo da história. 

Estas duas personalidades, antagônicas entre si, vão dar o tom de desencontro na relação de Burt e Mitzi. Temos a sensação clara de que os dois nunca estão em sintonia. 

A história ganha mais drama com a descoberta de infidelidade de Mitzi, pelos olhos de seu filho, que passa a carregar um fardo emocional retumbante. 

O fato é que temos duas personagens extremamente complexas como pais de Sammy Fabelman. Que podem ser doces, compreensivos e simpáticos, mas também conseguem demonstrar egoísmo, preconceito e ira. 

A história nos leva por diversos espaços e tempos distintos ao longo da narrativa. Todas elas nos contam detalhes de ordem pessoal, familiar ou social daquele período do século XX. 

Vemos o nascimento e amadurecimento da geração filha da guerra, resultante do desterro de diversas populações, que imigraram para o novo mundo em busca de oportunidades. 

Uma geração marcada por preconceitos de todas as espécies. Desde aqueles estruturais da sociedade capitalista, como o machismo e o racismo, até o antissemitismo, marca mais evidente do regime nazista na Europa.

Mas que produziu alguns dos grandes personagens mais criativos do século 20, tanto na música, quanto nas artes plásticas, como também no cinema. 

No alto de seus 76 anos de idade, Spielberg nos brinda com uma biografia: não individual, mas de todo o seu tempo. 

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