Tela de telefone exibe ícones de redes sociais, navegadores e do YouTube.

Se o PL das Fake News passar nos termos atuais, matamos a discussão democrática no Brasil

O assunto de fake news já domina o debate internacional há pelo menos uma década. Esta arma política se mostrou poderosa a ponto de inverter ordens democráticas e estabelecer líderes extremistas em democracias clássicas do mundo.

Agora, as classes políticas internacionais se empenham em criar estruturas legais que impeçam a proliferação de discursos de ódio por verdadeiras máquinas de mentira na internet.

No Brasil, está em discussão desde 2020 o Projeto de Lei 2630, do deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), que visa regulamentar e combater a disseminação de notícias falsas na internet nacional.

“O projeto deixa bem claro o que é uma conta identificada ou uma inautêntica, que é aquela que simula a identidade de outra pessoa para enganar o público; diz também o que é uma rede de distribuição artificial ou uma conta automatizada, que é aquela gerida por programa de computador – são os robôs. E também define o que é encaminhamento em massa de mensagens, no caso aquelas que são enviadas por mais de cinco usuários no intervalo de até 15 dias para múltiplos destinatários. (…)

Ele trata, por exemplo, de responsabilização, transparência, monetização e impulsionamento de conteúdo. Na prática, a proposta fala em moderação: pretende ampliar a lista de conteúdo que deve ser retirada do ar antes de uma determinação judicial…”

(Agência Brasil 24/04/2023)

Antes de qualquer análise, cabe ressaltar que discussões sobre como iremos lidar com as redes sociais, principalmente em como controlar sua tendência ao ódio e ao extremismo, são essenciais. É impossível conservarmos instituições democráticas em um mundo que abraça o vale-tudo virtual.

No entanto, cabe prudência para não criarmos problemas maiores que as soluções anteriores.

Em resumo, o texto do PL cria um sistema de denúncias de notícias falsas, de perfis fakes e de disseminadores destes conteúdos, sejam eles automatizados ou não. Assim, seria possível encontrar estes agentes das informações falsas, rotulá-los e responsabilizá-los posteriormente pelas ações.

O papel das redes sociais neste cenário seria de acolher as denúncias, catalogar os eventos e prestar contas das estatísticas encontradas. Já se estabelece uma responsabilidade limitada para corporações com tanto peso político e financeiro.

Seria necessário atribuir aos donos das redes a atuação de mediar os debates e coibir, de maneira rápida, a presença de conteúdos de natureza criminosa nas plataformas. Só as big techs possuirão recursos financeiros suficientes para empreender esta missão com sucesso.

Preocupa também qual será a postura preventiva das empresas sobre o tópico. Se o primeiro ato de combate ao conteúdo ilegal das redes for de desmonetização e desengajamento de tópicos sensíveis, como aborto, legalização de drogas ou mesmo de política institucional, toda a mídia independente sofrerá um duro golpe.

Talvez acarrete uma volta às plataformas descentralizadas, como os portais de notícia, que são mais onerosos para os produtores. Isso tornaria os projetos de apoio ainda mais pulverizados e a gestão de um projeto de comunicação, mais desafiadora.

Este cenário, caso se torne real, favorece os veículos de mídia tradicionais. O Globo definiu o PL como “urgente” em editorial recente. Com menos fontes de informação, disponíveis, aposta-se no retorno ao consumo de meios como TV e rádio.

Esqueceram-se, no entanto, que mudanças de paradigma não costumam ser freadas por jogadas de lawfare. Até elefantes já foram eletrocutados em praça pública para se demonizar a energia elétrica, no início do século XX. Dá certo? Não. Lembremos do velho Marx: as condições materiais e históricas são definem o que o mundo se torna.

Neste caso, a internet e a disseminação da informação digital é irrefreável. Nos cabe lidar com esta caixa de Pandora de maneira eficaz.

Cabe perceber que a regulamentação das redes sociais, portanto, é tão essencial quanto delicada. O papel dos Estados será principalmente de pesar a régua a favor da população que das grandes corporações de tecnologia. Só assim é possível enxergar um horizonte de verdadeira liberdade de expressão.

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